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domingo, 14 de abril de 2019

Um amigo de Israel na Alemanha


Sheila Sacks /

Perto de completar um ano no cargo de embaixador dos Estados Unidos na Alemanha, Richard Grenell, 52 anos, logo no primeiro dia de sua função publicou um tweet que provocou alvoroço nos meios diplomáticos de Berlim. 

Disse ele: “As empresas alemães que têm negócios com o Irã devem abandonar as operações imediatamente.” Neste mesmo dia, 8 de maio de 2018, Donald Trump anunciou a retirada dos EUA do acordo nuclear com o Irã.

Desde então, Grenell – que foi porta-voz dos EUA na ONU, de 2001 a 2008 - tem se mostrado um amigo incondicional do estado de Israel, atuando publicamente contra as atividades do movimento anti-Israel BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções); instando pelo total banimento da organização terrorista Hezbollah do território alemão, o que já ocorreu no Reino Unido, em março (a Alemanha aceita o que chama “a ala política” do Hezbollah, que no Líbano tem assentos no parlamento); e encorajando a Alemanha a se afastar de vez do acordo nuclear de 2015, com o Irã.

Em janeiro, Grenell obteve uma vitória diplomática para os EUA, com a Alemanha proibindo as aeronaves da empresa aérea iraniana Mahan Air de operar no país, por suspeita de dar suporte técnico e recursos para os terroristas xiitas do Hezbollah. Calcula-se que com a proibição se inibiu um fluxo de 345 milhões de dólares que seria direcionado à organização terrorista.

Desde 2011, essa companhia aérea foi banida dos EUA acusada de transportar agentes e armas para ações terroristas. E, no início de abril, o governo americano colocou a Guarda Revolucionária do Irã, a tropa especial do regime dos aiatolás, na lista de grupos terroristas.

Muito que fazer

Porém, em relação à Alemanha, o país continua no acordo com o Irã, não obstante empresas alemãs como a Siemens, a Bayer e a Telekom terem reduzido ou encerrado suas operações naquele país. Em fevereiro, o presidente alemão Frank-Walter Steinmeier parabenizou o Irã por ocasião das comemorações da revolução islâmica de 1979.

Ainda em fevereiro, desafiando um pedido de extradição dos EUA, o governo alemão deportou para a Turquia o terrorista turco Adem Yilmaz, responsável pelo assassinato de dois militares americanos, em um atentado em 2008.

A posição do presidente Trump que reconheceu Jerusalém como capital de Israel, em dezembro de 2017, é outro ponto de discórdia entre a Alemanha e os EUA. 

O país foi um dos 128 estados membros da ONU que votaram a favor de uma resolução que considera “nula e sem efeito” a decisão do governo americano. Um tema que Grenell propõe em todos os seus encontros diplomáticos, insistindo que o reconhecimento de Jerusalém é a constatação de uma realidade.

Somente em 2018, a Alemanha votou por 16 vezes a favor de resoluções anti-Israel nas Nações Unidas, de um total de 21, e se absteve em quatro delas. São resoluções que, entre outras, condenam Israel pelo tratamento dado aos palestinos e que pedem que Israel devolva as colinas de Golan à Síria.

Hoje, no país do holocausto, vivem cerca de 140 mil judeus (116 mil oficialmente registrados, segundo as entidades judaicas), a terceira maior comunidade judaica da Europa ocidental, atrás da França (450 mil judeus) e Reino Unido (300 mil). 

Coincidentemente, ano passado aumentaram, em quase 10% em relação a 2017, as ocorrências de atos antissemitas no país, atingindo a marca de 1.646 ações notificadas.

Memorial recebe críticas

Essa escalada ascendente de ações antissemitas já tinha levado o arquiteto americano Peter Eisenman a declarar, em 2016, que não julgaria possível instalar o seu polêmico Memorial do Holocausto de Berlim nos tempos atuais.

Em uma entrevista ao semanário alemão “Die Zeit”, Eisenman, de 86 anos e ascendência judaica, afirmou que o clima social na Alemanha mudou, e o que antes era considerado aceitável agora vem sendo alvo de questionamentos.

O arquiteto recebeu críticas pelo aspecto anônimo da obra, sem nomes das vítimas, e principalmente pelo seu formato aberto e acessível a qualquer um, permitindo selfies e comportamentos inadequados replicados pelos usuários nas redes sociais, ignorando que o local é um tributo às vítimas do maior genocídio da história moderna.

O Memorial aos Judeus Assassinados na Europa ( nome oficial da obra) foi inaugurado em maio de 2005, depois do projeto de Eisenman vencer uma competição de design em 1997. Está instalado na região central de Berlim, próximo ao Portão de Brandemburgo.

Composto de 2.711 blocos de concreto -  com comprimento e largura semelhantes, mas de diferentes alturas - dispostos em um terreno aberto e inclinado de 19 mil metros quadrados,o projeto permite que os visitantes percorram o seu interior como estivessem em um labirinto.

Todos os blocos de concreto foram revestidos de uma solução especial para evitar pichações. Mas Eisenman foi contra a medida e na véspera da inauguração, em entrevista ao “Spiegel Online”, afirmou, de forma surpreendente, que o memorial não é um lugar sagrado e se pichassem uma suástica, “isso seria o reflexo de como as pessoas se sentem”.

Na mesma entrevista ele confirmou que era contrário a construção de um centro de informações sobre o Holocausto. Entretanto, um anexo subterrâneo foi construído e o local guarda os nomes de todas as vítimas registradas pelo museu Yad Vashem, de Jerusalém.

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"Desculpe, pai, estou pensando em pedir um passaporte alemão"

A frase dá título a um artigo do jornalista judeu, Adrian Goldberg, publicado no site da BBC News, no final de dezembro de 2018. Nascido na Inglaterra, ele é um veterano apresentador de programas na rede britânica de rádio e TV, e resolveu tornar público o conflito moral que o aflige.

O motivo é o Brexit que vai provocar o desligamento do Reino Unido da União Europeia (UE) e a necessidade de seus cidadãos portarem vistos para viajar ou trabalhar em cada um dos 27 países que compõem o bloco. 
A saída foi mais uma vez adiada, desta vez para 31 de outubro, e enquanto a situação não se resolve, milhares de judeus ingleses,  filhos e netos de alemães mortos ou sobreviventes do Holocausto, se movimentam na busca de passaportes desse país.
Desde 2016, após o plebiscito no Reino Unido que consagrou a saída do país da União Europeia, a embaixada germânica em Londres recebeu mais de 3.380 pedidos de cidadania alemã, nos termos do artigo 116 da Constituição daquele país que beneficia os descendentes de judeus perseguidos pelo nazismo. Nos anos anteriores, a média de solicitação desses documentos não passava de 50.
Uma situação inimaginável, sabendo-se o que se passou na Alemanha nazista, há quase oito décadas. Agora, centenas de judeus britânicos têm a cidadania de um país onde seus avós mal conseguiram escapar vivos, observa Michael Newman, presidente da Associação Britânica de Refugiados Judeus, um grupo fundado em 1941 por judeus que fugiram do Holocausto.
Em seu artigo, Goldberg admite que obter o passaporte alemão pode ser útil para ele e suas três filhas para terem trânsito livre em mais de duas dezenas de países como qualquer cidadão da UE. Mas, para isso, teria que adotar a nacionalidade do país que assassinou a maior parte da família de seu pai. Uma atitude que poderia ser entendida como uma traição. 
O jornalista conta que visitou o cemitério onde o pai está sepultado em busca de resposta e dias depois indagou a sua mãe o que o pai, um fugitivo do nazismo, pensaria sobre isso. A mãe admitiu que provavelmente ele não aprovaria a ideia.
O pai de Goldberg, Rudy, faleceu há seis anos. Ele chegou à Inglaterra junto com a irmã, antes da guerra, graças a um programa apoiado pelo governo britânico intitulado Kindertransport que permitiu que 10 mil jovens judeus alemães se instalassem no país. Dessa maneira, foi salvo do Holocausto, casou, teve 4 filhos e viveu para conhecer os netos e bisnetos.
Enquanto isso, na Alemanha do século 21, a chanceler Angela Merkel faz um desabafo face à situação da comunidade judaica no país: “ Nos desanima o fato de que nenhum jardim de infância, nenhuma escola, nenhuma sinagoga poderem prescindir de proteção policial."
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Forças Armadas da Alemanha terão capelão judeu
Os 300 judeus alemães que estão alistados nas Forças Armadas da Alemanha (Bundeswehr), homens e mulheres, agora vão poder contar com um rabino em suas fileiras. A ministra da Defesa, Ursula von der Leyen, anunciou que vai nomear  um rabino como capelão militar atendendo pedido do Conselho Central de Judeus, organização que representa a comunidade judaica do país.
Desde a derrota na 1ª Grande Guerra (1914-1918), com a dissolução do então exército alemão, o país não tinha um rabino para oficiar os cultos religiosos e prestar assistência aos soldados. Após a 2ª Grande Guerra, foram os capelães judeus dos exércitos aliados estacionados na Alemanha Ocidental que abriram suas congregações militares à participação dos judeus que viviam no país.
Ao comunicar a decisão, a ministra alemã agradeceu às mulheres e homens judeus que servem no Bundeswehr, acrescentando que cada soldado, incluindo judeus e muçulmanos, tem o direito à prática religiosa e ao cuidado pastoral.
Os solados alemães não são obrigados a identificar a sua religião no momento do alistamento, mas o ministério da Defesa estima que um pouco mais da metade do contingente tenha se declarado espontaneamente. Assim, o ministério listou 53 mil militares protestantes, 41 mil católicos, 3 mil muçulmanos e 300 judeus, de um universo de 182 mil militares ativos.