linha cinza

linha cinza

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

A imortalidade ao alcance de todos

por Sheila Sacks


Mais de 30 milhões de pessoas já falecidas continuam “vivas” no Facebook mostrando que a imortalidade é possível na internet

publicado na Curadoria de Notícias do Observatório da Imprensa

Lançado em 2004, o Facebook congrega mais de 30 milhões de usuários falecidos que permanecem na rede social  numa demonstração inequívoca de que existe vida após a morte nessa segunda década do século 21, pelo menos no espaço virtual. Com tantas almas vagando pelas redes, o equivalente à população de uma Xangai e meia, não será motivo de surpresa se os vivos do Face possam receber curtidas e eventualmente pedidos de amizade de pessoas que jamais irão conhecer pessoalmente caso a curiosidade e a simpatia de um sorriso os encantem.

No artigo “Vida virtual após a morte”, o doutor em genética e biologia molecular Javier Sampedro, que escreve regularmente para o jornal EL País, acredita que a permanência desses avatares nas redes funciona como uma espécie de homenagem e consolo para amigos e familiares. A transcendência da imagem do morto que ganha um corpo virtual seria uma maneira de mostrar deferência ao falecido e segundo o autor “essa é a maneira de morrer nesta aurora do terceiro milênio, e faltar com ela começa a parecer tanta desconsideração quanto usar gravata vermelha em velório.”

A tendência, porém, não impede que sites como o Postumer.com ofereçam seus serviços para apagar a passagem do morto pelo mundo virtual, incluindo seus blogs, websites e contas de e-mails. Outros, por outro lado, se dedicam a compilar a história do finado como o Grupo Mémora. O pesquisador espanhol lembra que o legado digital não para de crescer e que mensalmente são publicados 55 milhões de fotos no Flickr – o site de hospedagem de fotos gratuitas - e centenas de milhares de vídeos diários no Youtube. Para esses números também concorre a mania dos selfies em cerimônias fúnebres. Pesquisa da funerária britânica “Perfect Choice Funerals” indica que um terço das pessoas que participam de enterros tira selfies no cemitério e muitas delas postam, de imediato, no Instagram.

Mas, de certo modo, a possibilidade metafórica de um morto continuar vivo nas páginas do Facebook expõe nossa dualidade de lidar com a morte. “Todos entendemos perfeitamente a morte, desde que seja a morte dos outros”, escreve Sampedro. “Viver tranquilamente até que ela (a morte) chegue não é senão uma consequência de como é difícil entender a ideia de não ser”, explica.

Autor do livro “Deconstruyendo a Darwin (2013), Javier Sampedro é conclusivo acerca do anseio humano à imortalidade. Para o cientista, “a morte é algo tão concreto quanto a própria vida que é feita de coisas que se deterioram, se degeneram e se desintegram”.