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sábado, 30 de novembro de 2013

O projeto baiano de Reuven Feuerstein

“Educar é apostar no outro” (Feuerstein)

 por Sheila Sacks

Há quase 15 anos, um senhor de longa barba branca, sorriso bondoso e olhos meigos aterrissou em Salvador, na Bahia. O ano era de 1999 e ele, apesar da roupa escura e pesada, parecia bem à vontade naquele paraíso tropical. O professor e psicólogo Reuven Feuerstein, então beirando os 80 anos, vinha do outro lado do mundo, do pequeno estado de Israel, para assinar um contrato com o governador do estado e a Fundação Luis Eduardo Magalhães na área da educação pública. Pelos próximos 10 anos, até 2009, o seu método de melhoria de aprendizado conhecido como PEI – Programa de Enriquecimento Instrumental, seria aplicado nas escolas de ensino médio baianas. Na ocasião, Feuerstein declarou textualmente: “É a primeira vez quer um governo entende que a inteligência é um direito, e assume o dever de proporcionar condições para desenvolvê-la.”

O método, que visa aumentar o potencial de aprendizado dos alunos, foi criado há quase 50 anos em Israel por Feuerstein para aumentar o desempenho cognitivo de crianças e jovens sobreviventes dos campos de concentração da Segunda Guerra Mundial. Atualmente vem sendo utilizado em mais de 40 países, sempre sob a supervisão do ICELP de Jerusalém (Internacional Center for the Enhancement of Learning Potencial), fundado pelo professor Feuerstein – ele mesmo um sobrevivente do Holocausto.

O programa em larga escala desenvolvido na Bahia durante 10 anos é sempre citado por Feuerstein como um dos mais importantes para a divulgação de sua teoria. Em 2004, na Holanda, por ocasião do 25º Seminário Internacional do ICELP, a experiência baiana ganhou efusivos elogios do mestre israelense: “O Brasil merece os parabéns não apenas como campeões do futebol, mas também por ser um exemplo pelos cuidados com o desenvolvimento, progresso e adaptabilidade a grandes massas de populações carentes de ajuda (...). Por isto e por muito mais gostaríamos de expressar a nossa gratidão às autoridades educacionais na Bahia e no Brasil, em geral.”

Um método que nasceu com os órfãos de guerra

Reuven Feuerstein, de 92 anos, iniciou os seus estudos de Pedagogia e Psicologia na Romênia e emigrou para Israel em 1944, com 23 anos. Ainda em Bucareste, entre 1940 e 1944, foi professor de crianças com distúrbios e deficiências de aprendizado. Fez parte da Resistência contra os nazistas e teve que fugir para se salvar. Em Israel, entre 1945 a 1948, atendeu os órfãos sobreviventes dos campos de concentração, muitos deles classificados, nos testes de QI, como mentalmente retardados.

Concluiu seus estudos em Psicologia geral e Clínica na Universidade de Genebra (1954) e obteve o Doutorado em Psicologia do Desenvolvimento na Universidade de Sorbonne, em Paris (1970). Estudou com grandes mestres, como Carl Jaspers, Carl Jung, L. Szondy, Andrey Rey e Jean Piaget. Entre 1950 e 1954 foi diretor do Serviço de Psicologia do Programa Youth Aliyah, na Europa, que trouxe milhares de crianças e adolescentes judeus de Marrocos, Tunísia, Argélia e Egito para uma vida integrada em Israel. Durante muitos anos foi diretor do Instituto de Pesquisas Hadassah-Wizo-Canadá, em Jerusalém - para crianças com distúrbios emocionais e mentais – incorporado, em 1993, ao ICELP.

Sua teoria parte do princípio de que o cérebro é modificável, e por isso é possível elevar o nível de inteligência em crianças e jovens marcados por grandes privações e traumas. De forma geral, o programa é formado por 14 exercícios semelhantes a testes psicotécnicos. O aluno explica como fez para resolver os exercícios, discute as conclusões e as relaciona com sua vida. Desenvolve a capacidade analítica, o raciocínio lógico e a autoestima, além de trabalhar a ansiedade e a impulsividade.

Feuerstein também ensinou Psicologia Educacional na Universidade Bar-Ilan, em Ramat Gan e foi professor adjunto da Vanderbilt University’s Peabody College of Education, nos Estados Unidos. Filho de rabino e pai do rabino Rafi Feuerstein – também psicólogo e vice-diretor do ICELP - o professor Reuven tem um neto de 24 anos com Síndrome de Down.