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domingo, 25 de março de 2018

A pergunta que não quer calar: quem matou Nisman?


Em entrevista ao canal CNN, o ex-presidente argentino e atual senador Carlos Menem, de 87 anos, disse acreditar que o promotor Alberto Nisman não se suicidou e classificou seu assassinato de escandaloso. Foi no programa “Perspectivas”, do jornalista Jonatan Viale, apresentado em fevereiro.
Nisman, de 52 anos, levou um tiro na cabeça, no banheiro de seu apartamento, no bairro de Puerto Madero, em Buenos Aires, em 18 de janeiro de 2015, quatro dias depois de ter denunciado a então presidente Cristina Kirchner e vários funcionários de seu governo de acobertarem as autoridades iranianas acusadas de planejar o atentado à Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA), em 1994, que matou 85 pessoas e deixou 300 feridos.
Na época do ato terrorista, Carlos Menem era o presidente do país e a execução do atentado ficou a cargo do grupo xiita libanês Hezbollah, ligado ao Irã e um dos seus braços armados.
O promotor assegurava que o acordo entre Irã e Argentina, selado no governo da presidente Kirchner, em 2013, justamente para esclarecer o atentado, na verdade foi uma farsa, já que importantes autoridades do então governo de Mahmoud Ahmadinejad estavam envolvidas.
Tese de suicídio
 Somente em dezembro de 2017, quase três anos após a morte do promotor, o juiz Julian Ercolini reconheceu que existiam provas suficientes para concluir que Nisman foi assassinado. Durante todo esse tempo, a tese de morte duvidosa e suicídio mobilizou as investigações tanto policiais quanto no âmbito da Justiça.
 A juíza Sandra Arroyo Salgado, que foi casada com o promotor, afirmou recentemente que a morte de Nisman deve ser considerada um crime de lesa-humanidade como foi nominado o atentado à AMIA. Segundo a magistrada, havia um duplo objetivo na morte do promotor: silenciar Nisman (‘porque a única maneira de calá-lo era a morte’) e intimidar juízes, promotores e quem tivesse a coragem de investigar o governo.
Ano passado, acompanhada das duas filhas, a juíza esteve em Israel onde foi recepcionada pelo presidente Reuven Rivli e participou da inauguração de um monumento em memória do promotor argentino. Antes, foi recebida pelo Papa Francisco, em Roma, em um encontro no qual pediu ao sumo pontífice para "continuar orando para encontrar a verdade".
Mas, apesar da repercussão internacional do assassinato, até agora ninguém foi preso e o único indiciado é o técnico de informática Diego Lagomarsino que emprestou ao promotor a pistola calibre 22, encontrada ao lado do corpo.
 No final do ano passado, a Procuradoria argentina pediu uma pena de quatro anos de prisão para Menem por acobertar os iranianos durante o seu mandato.
Em outro processo, o juiz Claudio Bonadio emitiu uma ordem de prisão contra Cristina Kirchner (e o seu ex-chanceler Héctor Timerman, primeiro judeu a chegar ao status de ministro do Exterior) pelo obscuro acordo com o Irã e por “traição à pátria”.
Entretanto, por serem senadores e desfrutarem de imunidade parlamentar, Menem e Cristina não podem ser presos.
Destruição de provas
Ainda em 2010, Carlos Menem foi processado por abuso de autoridade, destruição de provas, falsidade ideológica e obstrução das investigações. No mesmo processo foram incluídos o seu irmão Munir Menem (que foi ex-embaixador na Síria), o juiz federal encarregado do caso, Juan José Galeano, dois policiais responsáveis pelas investigações e dois ex-dirigentes da secretaria de Inteligência (SIDE),
Nisman, promotor do caso, acusou Menem de ter ordenado a ocultação de provas. O irmão do ex-presidente teria transmitido as ordens ao juiz, aos policiais e aos integrantes do SIDE. Segundo Nisman, foram destruídas 54 fitas cassetes que eram consideradas fundamentais para a investigação.
O grupo também foi denunciado por bloquear a investigação da chamada “pista iraniana”, uma das vertentes do processo. Relatório da promotoria incrimina Menem por acobertamento das autoridades iranianas responsáveis pela autoria intelectual e material do atentado, entre elas o ex-presidente Ali Rafsanjani (1989-1997), o ex-ministro da Defesa Ahmad Vahidi e o ex-conselheiro cultural na embaixada de Teerã, em Buenos Aires, Moshen Rabbani.
Em 2002, reportagem do jornal The New York Times obteve o testemunho secreto de um desertor iraniano que fugiu para a Alemanha, identificado como Abdolghassem Mesbahi. Ele garantiu que foram depositados 10 milhões de dólares em uma conta bancária de Menem, na Suiça, para que este isentasse o Irã de qualquer participação no atentado.
Amigo de Menem
Em relação ao envolvimento do empresário sírio-argentino Alberto Kanoore Edul, falecido em 2010, ele era suspeito, assim como seu filho, Alberto Jacinto, de integrar a chamada “conexão local” que participou do ato terrorista.
Amigo de Menem e de Rabbani, o empresário foi apontado como o proprietário da van renault trafic, estacionada em frente ao prédio da AMIA, na manhã de 18 de julho de 1994, uma segunda-feira, por volta das 10 horas. O veículo carregado de 300 a 400 quilos de TNT (trinitrotolueno) explodiu em plena via pública, derrubando o edifício de sete andares, que ficou em escombros. 

O prédio recebia obras de reforma e era comum a presença de caminhões no local para a remoção de entulhos. De acordo com o testemunho de Norberto Godoy, empregado da firma de Kanoore Edul, o empresário e o filho se mostraram interessados, dias antes do atentado, na compra de uma caminhoneta. 
O empresário tinha vínculos jamais investigados com Rabbani e segundo o depoimento de Carlos Gardiner, secretário da Câmara de Comércio Árabe-Argentina, Edul transitava no interior da Casa Rosada como fosse um funcionário do staff de Menen.
No julgamento, iniciado em 2015, que culminou com o pedido do Ministério Público de quatro anos de prisão para Menem, outros envolvidos também sofreram pedidos de prisão, entre eles, o ex-juiz encarregado do caso AMIA, Juan José Galeano, (13 anos de prisão), o ex-chefe do Serviço de Inteligência, Hugo Anzorreguy (6 anos), e o ex-líder da DAIA (Delegación de Asociaciones Israelitas Argentinas), Rubén Beraja (1 ano).
O caso Beraja
Congregando 140 instituições judaicas, a DAIA tinha escritórios no prédio da AMIA, na Avenida Pasteur, 633. Fundada em 1935, é a organização representativa da comunidade judaica no país. Entre 1991 e 1998, Rubén Beraja comandou a organização e foi durante um de seus mandatos que ocorreu o atentado à AMIA.  
Dono e ex-presidente do falido Banco Mayo, ele foi processado pela Justiça por administração fraudulenta contra a administração pública, no caso o Banco Central argentino. Também foi processado, junto com o ex-juiz federal Galeano, de participação de uma oferta de 400 mil dólares a Carlos Alberto Telleldín – o mecânico que teria preparado a van usada para explodir o edifício – para desviar o rumo das investigações com falsas informações. Beraja, de 77 anos, sempre negou todas as acusações, inclusive a de que mantinha uma estreita relação de amizade com o ex-presidente Carlos Menem.
Em 2015, a ex-mulher de Carlos Telleldín confirmou diante de um tribunal federal que recebeu em 1996, em nome do marido, os 400 mil dólares do governo de Menem para envolver policiais da província de Buenos Aires no atentado. Disse, ainda, que foi ameaçada para não quebrar o pacto. Ano passado, Galeano defendeu o citado pagamento afirmando, em juízo, que o objetivo não era obter uma declaração falsa, mas obter informações verdadeiras.
Por seu lado, Telleldín, que ficou detido de 1994 a 2004, assegura que não se arrepende de ter recebido o dinheiro, porque, segundo ele, foi uma estratégia para demonstrar que o caso era uma farsa. Ele e mais 22 suspeitos de integrarem a “conexão local” foram absolvidos por um tribunal federal em 2004.
Outras motivações
Editor da revista judaica independente “La Voz Y la Opinión”, Daniel Schnitman tem uma visão diferente a respeito do que motivou o atentado.
Em sua opinião, a bomba não visava a AMIA, que é uma instituição assistencial, que ajuda as pessoas. O alvo seria a DAIA, a representação política da comunidade judaica, presidida por Beraja, então presidente da Federação dos Bancos Cooperativos e dono do Banco Mayo. “Puseram a bomba contra a DAIA por seus negócios escusos vinculados à lavagem de dinheiro”, afirma. “E houve um interesse natural da comunidade de encobrir e afastar Bereja do palco do atentado”, sustenta o jornalista.
Outra especulação apresentada logo após o atentado envolveria neonazistas argentinos insatisfeitos com a abertura dos arquivos policiais sobre os criminosos nazistas que se refugiaram no país depois da 2ª Guerra Mundial. Semanalmente, às segundas, um grupo de pesquisadores se reunia no prédio da AMIA para analisar os documentos, sob os auspícios do “Project Witness” (Projeto Testemunho), uma organização voltada para a memória do Holocausto, com sede no Brooklyn.
Um de seus integrantes, o escritor e sociólogo Carlos Escude, conta que naquela fatídica segunda-feira o grupo decidiu não trabalhar em função das férias escolares. “A bomba estava pronta para explodir justamente no dia em que o grupo se reunia, afirma Escude. O material também não foi destruído porque era guardado no escritório de um prédio adjacente.
Atualmente, Carlos Escude é diretor do “Centro de Estudios de Religión, Estado y Sociedad – CERES”, ligado ao Seminario Rabínico Latinoamericano 'Marshall T. Meyer'. 
Revelações de um ex-espião
Chefe de operações do Serviço de Inteligência do Estado (SIDE, na sigla em espanhol) por mais de quatro décadas, Antonio "Jaime" Stiuso fugiu para os Estados Unidos, em fevereiro de 2015, semanas depois do assassinato de Nisman. Ele tinha sido exonerado do cargo por Cristina Kirchner, em dezembro de 2014, e era um dos principais informantes nas investigações de Nisman sobre a AMIA e o acordo Irã-Argentina. Sentindo-se ameaçado, ele deixou o país, via Porte Alegre, e pediu asilo nos EUA.
Desde fevereiro de 2016, com um novo governo na Argentina (Mauricio Macri assumiu em 10 de dezembro de 2015), Stiuso já retornou ao país algumas vezes para prestar depoimentos. Em suas entrevistas ao La Nacion e ao Clarín, ele tem afirmado que o governo de Cristina mandou matar Nisman pelas provas que o promotor vinha apresentando à Justiça de que o governo pactuou com o Irã a impunidade dos culpados. Revelou que os Kirchner, tanto Cristina como seu marido Néstor – que foi presidente de 2003 a 2007 – mantinham um aparelhamento paralelo de inteligência para espionar a oposição.
Com a morte de Nisman, a presidente resolveu extinguir o SIDE que era comandado por Stiuso e criar a Agência de Inteligência Federal (AFI), com a aprovação do Congresso. A alegação foi de que o órgão estava municiando Nisman de informações falsas.
Documentário via Internet
No início de outubro de 2015, oito meses depois da morte de Nisman, um documentário de 77 minutos dirigido pelo americano Matthew Taylor, produtor de filmes para TV, estreou em Washington, no Newseum (museu dedicado ao Jornalismo), e simultaneamente na Internet.
O filme “Los Abandonados” conta detalhes das investigações sobre o atentado ao prédio da AMIA, as falhas nos processos ao longo de sucessivos governos, as implicações com o governo do Irã, a denúncia de Nisman e seu assassinato. Apresenta depoimentos de jornalistas, políticos, peritos, juízes, procuradores e ex-integrantes do serviço de Inteligência.
Um dos entrevistados, o jornalista Hugo Alconada Mon, do jornal La Nacion, afirma que o promotor foi vítima de uma “fatwa”, uma ordem de Teerã para matá-lo, à medida que avançava na investigação sobre a conexão iraniana.
Na época do seu lançamento, membros do governo da presidenta Cristina Kirchner acusaram Taylor de estar ligado à direita americana (ele realizou campanhas para o Partido Republicano) e ter seu filme financiado por fundos abutres (empresas especializadas em comprar títulos de créditos vencidos).
O chanceler Héctor Timerman também chamou os participantes do filme de cúmplices de “holdouts” (especuladores financeiros). Atualmente, padecendo de um câncer, Timerman obteve uma licença humanitária e viajou no início de março para realizar um tratamento experimental nos EUA.
Mas, enquanto o mistério sobre a morte de Nisman permanece longe de um desfecho, o enredo de um atentado, suas ramificações internacionais, repercussões políticas e conseqüências pessoais estão na mira da  gigante Netflix, com mais de 100 milhões de assinantes.
A produtora americana já prepara, para 2018, uma minissérie que pretende refazer os últimos dias do promotor, misturando realidade e ficção. Sob a direção do inglês Justin Webster, as filmagens começaram em fevereiro na capital argentina.

Em tempo: Carlos Menem presidiu a Argentina de 1989 a 1999. Cristina Kirchner, de 2007 a 2015.



quinta-feira, 15 de março de 2018

Das fake news às falsas histórias


Por Sheila Sacks                        

Publicado no "Observatório da Imprensa" 


Se as fake news (notícias falsas) são um fenômeno recente, as fake histories (histórias falsas) se perdem no tempo. Isso porque de todas as ciências humanas, a história é a mais indefinida em seus intentos, a mais limitada em seus meios, aquela que menos admite métodos rigorosos e a que tem mais dificuldade em superar seus erros e enganos.

A frase do historiador Pierre Daunou tem mais de 200 anos e reflete séculos de narrações tidas como verdadeiras, mas que efetivamente não passam de versões mentirosas dos fatos, falsos testemunhos, documentos forjados e criações históricas.

A história em xeque

Sobre essa coleção de erros humanos em que se apoia a historiografia, o historiador François Dosse, autor de “História em Migalhas”, reconhece que a história ainda é frequentemente considerada fonte de corrupção. “As mentiras são mais fascinantes do que a verdade”, dizia Umberto Eco. “E nem todas as verdades são para todos os ouvidos”. Para o escritor italiano, “os jornais mentem, os historiadores mentem, a televisão hoje mente”.

Também George Orwell, autor de “1984” e “A Revolução dos Bichos”, era um cético em relação à ciência histórica. Considerava que “em tempos de embustes universais, falar a verdade é um ato revolucionário”.

Mas, em se tratando de um historiador, a busca pela verdade deve ser a sua primeira e única obrigação. Isso porque a partir de suas narrativas, indivíduos e povos poderão ser assolados por vicissitudes e barbáries, “igualmente cometidas pelos brutos e pelos civilizados, ignorantes e instruídos, cínicos e devotos, egoístas e heróicos”. Vasculhar os escaninhos da história e não se render às narrativas oficiais já é uma forma de combater esse tipo de mazela milenar.

Caso Dreyfus

O caso do capitão Dreyfus, ocorrido em 1894, é emblemático. Envolvido em uma trama que o levou à prisão e a ser expulso das Forças Armadas francesas, o militar foi vítima de uma fake history que arruinou a sua vida pessoal e profissional.

Acusado de espionagem a favor da Alemanha, ele foi julgado sumariamente por alta traição e condenado ao degredo perpétuo na Ilha do Diabo, na Guiana Francesa. Anos depois, comprovou-se que as provas secretas contra  Dreyfus eram um embuste. Ele recebeu o indulto em 1899, mas somente em 1906 o julgamento espúrio foi cancelado.

Entretanto, se passou um século para que sua inocência fosse oficialmente reconhecida pelo exército da França. Isso se deu em 1995, quando o general Jean-Louis Mourrut, chefe do “Service Historique de l`Armée de Terre” (atual ‘Service historique de la Défense’ – SHD) classificou, publicamente, o caso Dreyfus  de “uma conspiração militar, fundada parcialmente em documento falso que resultou na deportação de um homem inocente”.

O falso como verdadeiro

Com o intuito de mostrar os procedimentos ardilosos de pessoas sem escrúpulos que movidas pelo ódio e ambições políticas inventam mentiras e as transformam em supostas verdades, Umberto Eco escreveu “O Cemitério de Praga”, publicado em 2010.

Tendo como base fatos e personagens verídicos que participaram da elaboração e da disseminação de “Os Protocolos dos Sábios de Sião”, o autor reconstrói o século 19 através de uma narração polêmica, que recebeu críticas do Vaticano e do rabinato de Roma.

Eco narra o nascimento e a evolução desse abjeto complô, criado com a finalidade de atribuir aos judeus uma fictícia conspiração para dominar o mundo. 

Os falsos documentos forjados pela polícia secreta do Czar Nicolau II, em 1897, foram utilizados por Hitler em sua política de extermínio, incluindo-os em “Mein Kampf”, apesar de o jornal  britânico The Times, em 1921, já ter desmascarado a farsa.

Ainda assim, o magnata Henry Ford levou os Protocolos, na tradução inglesa, para os EUA, publicando-os em forma de livro. Por sua vez, o rei Faisal, da Arábia Saudita, costumava oferecer os Protocolos, em sua versão árabe, às autoridades que visitavam o país.

Em uma de suas entrevistas aos jornais italianos, Umberto Eco ressaltou o perigo que se esconde nas chamadas “conspirações falsas”, pelo seu alto grau de manipulação e dada à dificuldade em desmenti-las. ”A característica de uma conspiração verdadeira é que ela é invariavelmente descoberta”, analisa. “Hitler e o nazismo propagaram a falsa conspiração dos judeus como verdadeira e tiraram proveito dos Protocolos.”

O poder da mentira

Mas, por que as pessoas ainda consomem essa farsa? Será por ignorância? Por curiosidade? Os Protocolos, afinal, seguem sendo oferecidos e vendidos em uma dezena de idiomas, em formato de livro, com circulação livre na internet.

Juíza em Israel por mais de 30 anos, Hadassa Ben-Itto investigou o embuste durante seis anos e em 1998 publicou “A Força da Mentira”, traduzido para o português no ano passado. “Escrevi esse livro como um desafio a todos aqueles que inadvertidamente permitem que essa e outras mentiras similares sejam espalhadas e provoquem danos contínuos”, explica.

Em sua opinião o conceito de “liberdade de expressão” não deveria acobertar mentiras. “Uma mentira deliberada não é uma ideia”, reforça. “Ela pode facilmente se transformar em uma arma perigosa e como tal deve ser banida, assim como outras armas que têm o potencial de causar assassínios em massa e destruição.”

Uma perspectiva diferente daquela defendida pela filósofa Hannah Arendt que questionava o fato de estudiosos do tema centrarem o foco, basicamente, no processo de falsificação. Na sua percepção, o mais importante, nos tempos atuais, seria descobrir o porquê do reiterado interesse das pessoas por uma declarada mentira, já devidamente desmistificada, cujo poder de perenidade surpreende e assusta. 

sexta-feira, 2 de março de 2018

Restos mortais de israelenses nas mãos do Hamas


Por Sheila Sacks
A celebração anual em memória aos soldados mortos em defesa da pátria e às vítimas de atos terroristas –  o Yom Hazikaron – que este ano vai ocorrer após o anoitecer de 17 de abril e durante o  dia 18, feriado nacional, provavelmente ainda terá um componente dramático que se arrasta há quase quatro anos: o sequestro dos restos mortais de dois militares israelenses, pelo Hamas, em desprezo às Convenções de Genebra de 1949 (artigos 16 e 17), e aos protocolos do Direito Internacional Humanitário (DIH).
O tenente Hadar Goldin, de 23 anos, e o sargento Oron Shaul, 20 anos, foram mortos durante o conflito militar em Gaza, em 2014. Desde então, o grupo terrorista mantém os corpos dos soldados em seu poder, não permitindo que suas famílias os enterrem.
Mortes no cessar-fogo
Em 1 de agosto de 2014, menos de duas horas após o cessar-fogo humanitário entre Israel e o Hamas, terroristas do grupo emergiram de um túnel subterrâneo, no sul da Faixa de Gaza, e emboscaram uma unidade militar, matando o tenente Goldin e sequestrando o seu corpo.
Nesta ocorrência também foram mortos o major Benaya Sarel, de 26 anos e o sargento Liel Gidoni, de 20.  Dez dias antes, em 20 de julho, um míssil antitanque disparado pelo Hamas já havia atingido um blindado israelense matando sete soldados. Porém o corpo do sargento Shaul não foi encontrado.
O professor emérito de Direito, Irwin Cotler, ministro da Justiça do Canadá, de 2003 a 2006 e membro do Parlamento canadense por 16 anos (1999-2015), lembra que parte das responsabilidades da ONU é justamente garantir que as regras do Direito Internacional sejam cumpridas.

Renomado especialista de Direitos Humanos, Cotler afirma que desde o início o Hamas desconsiderou as Convenções de Genebra a partir da violação do cessar-fogo. Nos anos subsequentes, ignorou os princípios básicos do direito internacional humanitário, não fornecendo informações sobre o satuts dos soldados mortos ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha e não devolvendo os restos mortais as suas famílias.

Em dezembro de 2017, os pais do tenente Goldin estiveram no Conselho de Segurança da ONU em uma sessão dedicada à questão. Eles apelaram para que o órgão se mobilizasse com ações concretas para pressionar o Hamas, denunciando que o filho morreu durante um cessar-fogo patrocinado pela ONU.

Em sua campanha para trazer os restos mortais do filho, Leah Goldin contou também que o irmão gêmeo de Hadar, durante a guerra de Gaza, foi responsável pelo resgate de soldados feridos e mortos, salvando igualmente palestinos apanhados no fogo cruzado. “Enquanto nosso filho Tzur salvava famílias palestinas, nosso outro filho, Hadar, era morto e seus restos mortais sequestrados”, lamenta.

Túnel custa 5,9 milhões de dólares

Em janeiro deste ano, os pais dos militares mortos se encontraram com o enviado americano do governo Trump à região, Jason Greenblatt, que criticou o Hamas por reter os restos mortais dos israelenses.

Em visita a um túnel escavado sob a fronteira de Gaza, ele revelou que o Hamas gasta 5,9 milhões de dólares na construção de um único túnel de terror e cerca de 30 mil dólares por dia em receita perdida quando o túnel é fechado. “O Irã fornece anualmente ao Hamas 100 milhões de dólares e o Hamas derrama esse dinheiro na violência e no ódio, ao invés de melhorar a vida da população de Gaza”.

Greenblatt também acusou o Irã de patrocinar o terror contra Israel injetando recursos da ordem de 1 bilhão de dólares anuais no Líbano e Cisjordânia, além de Gaza. “Um dinheiro sujo de sangue que só aumenta a violência e não melhora a vida do povo palestino.”

Em junho do ano passado, Greenblatt, que é o representante especial dos EUA para negociações internacionais, já havia se encontrado com os pais dos militares em Israel e emitido um comunicado manifestando a sua indignação com a recusa do Hamas em devolver os corpos dos israelenses e seu apoio na luta das famílias para resolver o impasse.

O conflito em Gaza (‘Operação Margem Protetora’) teve início em 8 de julho de 2014, impulsionado pelo sequestro e assassinato de três adolescentes israelenses, ocorrido em 12 de junho. A operação durou 51 dias e se encerrou em 26 de agosto. Sessenta e sete soldados morreram nos confrontos.

Fontes:
Jerusalem Post – “Where is world outrage over Hadar Goldin and Oron Shaul?” (Richard Kemp, Jim Molan, Arsen Ostrovsky), em 30.04.2017
The Media Line – “The legal and moral battle to bring home Hadar Goldin and Oron Shaul” (Charles Bybelezer), em 28.01.2018.
Jerusalem Post – “Greenblatt slams Hamas use of Iranian ‘blood mone’ for terror” (Eitan Halon), em 05.02.2018