/ Sheila Sacks /
Em 1492, milhares de judeus sefarditas foram impelidos ao desterro para escapar das garras da Inquisição e da conversão forçada na Espanha. Infortunadamente, um ano depois, já em Portugal, 2 mil crianças, filhos desses judeus espanhóis, são arrancadas dos pais e levadas para uma ilha despovoada da África, infestada de serpentes peçonhentas, ratos do tamanho de coelhos e lagartos gigantes.
Para lembrar os 530 anos da
expulsão dos judeus da Espanha e sua saga de sofrimento, uma escultura foi
inaugurada, em 31 de março, no Porto de Cartagena, local da derradeira visão da
Península Ibérica para aqueles judeus que partiam pelo mar em direção ao desconhecido.
Período de terror
Iniciada no século 12, a
Inquisição atravessou os séculos como instrumento de perseguição, tortura e
assassinatos. A Igreja Católica, através de seus tribunais e inquisidores
saídos das fileiras das Ordens Dominicanas e Franciscanas, instalou um império de
horror e perseguições contra grupos e comunidades não católicas da Europa e das
Américas. Eram apontados como hereges, caçados, torturados e queimados vivos,
por não seguirem os cânones religiosos estabelecidos pelos papas.
O astrônomo e matemático judeu
Abrãao Zacuto (1450-1522), nascido em Salamanca, estima
que 120 mil judeus espanhóis optaram pela fuga – ele mesmo um deles - abandonando suas casas, seus bens e deixando
para trás toda uma história pessoal e cultural estruturada por séculos. Despojados
de seus pertences e de sua dignidade em uma diáspora dolorosa imposta por uma
Igreja sectária e sem piedade que dominou a Europa na Idade Média e estendeu
seus tentáculos em séculos posteriores.
Na Espanha- a Sefarad para os
judeus, palavra hebraica em alusão à Península Ibérica – a Inquisição foi estabelecida
em 1478 e se tornou uma das mais cruéis do continente e além-mar, com milhares
de execuções na fogueira, inclusive de conversos. Nos “autos da fé”, os
condenados eram queimados vivos em atos públicos. Documentos apontam entre 130
a 150 mil processos de suspeita de heresia, com julgamentos sumários, conversões forçadas e
sentenças de morte.
Em 31 de março de 1492, os reis
Fernando II de Aragão e Isabel de Castela emitem a Ordem de Alhambra, documento
que determina a expulsão dos judeus da Espanha e a obrigatoriedade da conversão
ao catolicismo para aqueles que ficam no país. Mesmo assim, as perseguições
continuaram e os conversos, denominados cristãos novos ou marranos, eram
tratados com desconfiança pelo clero, autoridades e a própria sociedade.
A inquisição na Espanha foi
extinta em 1834, mas somente em 1968 o governo espanhol revogou oficialmente o
nefasto decreto abrindo a possibilidade, a partir de 2015, de descendentes de
judeus sefarditas pleitearem a nacionalidade espanhola.
Deportação
de 2 mil crianças
Em Portugal, para onde a grande
maioria dos judeus sefarditas acorreu, o monarca D.João II (1455-1495) permitiu
a entrada dos refugiados, mas com um salvo-conduto de oito meses. Ele faleceu
em 1495 e o sucessor D.Manuel decretou a expulsão dos judeus no ano seguinte,
estabelecendo a data de 5 de dezembro de 1497 como prazo final da retirada ou a
conversão ao cristianismo.
Mas a estadia dos judeus fugidos
da Espanha sob a coroa de D.João II teve momentos trágicos. Um dos mais abomináveis
foi a deportação de duas mil crianças judias para a ilha de São Tomé, no Golfo
da Guiné, a 300 quilômetros do continente africano, terra descoberta em 1470
sob seu reinado. As crianças, separadas à força de seus pais, a partir do porto
de Lisboa, foram postas em barcos e enviadas à ilha despovoada repleta de
animais selvagens. O donatário de São Tomé, Álvaro de Caminha, recebeu carta
branca do rei para trazer escravos, degredados e os filhos dos judeus conversos
que ainda viviam no reino. Uma ilha com área de 859 km2, menor que a cidade do
Rio de Janeiro, e que no século 16 se torna o maior entreposto de escravos da
África para o Brasil.
O relato da deportação das crianças foi narrado por Samuel Usque (1530-1596) em Consolação às Tribulações de Israel, provavelmente escrito em 1553. Judeu português fugido de Castela, Usque conta o desespero de pais e filhos diante da inevitável separação, com mães desconsoladas se jogando ao mar com suas crianças numa tentativa extrema de mantê-las perto de si.
“Quando essas crianças inocentes
chegaram à selva de São Tomé, o que seria os seus túmulos, elas foram levadas à
costa e deixadas ali sem compaixão. Quase todas foram engolidas pelos grandes
lagartos da ilha e as que ficaram, pois escaparam dos répteis, morreram de fome
e abandono.” Em um ano, apenas 600 crianças ainda se mantinham vivas.
Mais duas outras narrativas sobre
esse período de dor são registradas por Salomão Ibn Verga (1460-1554) e Yosef
Ha-Cohen (1496-1575). Judeu espanhol, Ibn Verga viveu em Portugal após a
expulsão da Espanha e depois se refugiou na Itália. Ele é autor do livro Shebet
Yehudá (Cetro de Judá) que descreve o deslocamento forçado dessas crianças à
ilha de São Tomé, que juntamente com a ilha de Príncipe eram desabitadas. O
relato apareceu pela primeira vez em 1550, na Turquia.
A crônica Shebet Yehuda contém ainda um relato de perseguições e
descreve costumes judaicos em diferentes países. No capítulo 59, está
dito: “Quem não assistiu estas terríveis cenas de prantos, choros e gritos de
mulheres, jamais haverá visto e escutado tamanha preocupação e desconsolo. Ninguém
consola e ninguém protege ou defende.”
Também nascido em Sefarad, Yosef Ha-Cohen escreveu o livro Emeq Ha-Baqa
(Vale das Lágrimas), publicado em 1575. Expulso da Espanha, foi para Portugal e
faleceu em Gênova. Ele narra em suas crônicas as agruras e o desespero dos
judeus no porto de Lisboa. “Todas as mulheres choravam aos prantos, quando seus
filhos lhes eram arrancados dos braços, enquanto seus maridos, amargurados e
desesperados, arrancavam suas barbas à força.”
Outros relatos
Existem ainda relatos de cronistas não judeus da época, como o de
Valentim Fernandes (1450-1519), nascido na Morávia e que trabalhou para a Coroa
Portuguesa como impressor, editor e tradutor. Em 1506, ele escreveu: “Mandou o
dito rei com esse capitão (Álvaro Caminha, o donatário da ilha), 2.000 meninos
de 8 anos para baixo, que tomou aos judeus castelhanos e os mandou batizar, dos
quais morreram muitos, porém pelo presente serão vivos entre machos e fêmeas
bem 600.”
Sobre os
ferozes lagartos, semelhantes a crocodilos, Valetim descreve literalmente: “Lagartos havia muitos e agora
poucos, de doze côvados em longo. E comem homens e mulheres, vacas e bois e
animalia. Estes lagartos não vão fora de água senão que sempre lhes fica o rabo
na água doce. E qualquer animalia que toma logo dá com ela na água e dentro na
água a mata e come. Empina-se sobre o rabo como um homem em pés.”
Além dos
lagartos, Valentim fala sobre ratos gigantes e enormes cobras que infestavam a
ilha: “Cobras há nesta ilha muito
peçonhentas de dois côvados de longo e de um braço de homem em gordo. E estão
olhando os homens e não fogem deles. Estas cobras são negras de cor.“
O
cronista-mor do reinado de D.João II, o português Rui de Pina (1440-1522),
também secretário e embaixador do reino, narrou o episódio em suas crônicas: “Neste
ano de 1493... o rei deu a Álvaro de Caminha a capitania da ilha de São Tomé de
direito e herança; e quanto aos judeus castelhanos que não havia deixado seu
reino dentro do prazo data, ordenou que, de acordo com a condição à sua
entrada, todos os meninos e rapazes e meninas dos judeus sejam levados cativos.
Depois de ter todos eles se tornaram cristãos, ele os enviou para a dita ilha
com Álvaro de Caminha, para que ao ser isolados, teriam motivos para serem
melhores cristãos, e [o rei] teria por essa razão para que a ilha seja melhor
povoada, o que, como resultado, culminou em grande crescimento.”
Outra narrativa, desta vez de Garcia de Resende (1470- 1536), compilador
e secretário particular do rei D.João II, repete o que já foi dito por Pina em
relação à motivação do desterro das crianças: “Para serem apartados dos pais e
de suas doutrinas e de quem lhes pudesse falar da lei de Moisés, fossem bons
cristãos; e também para que, crescendo e casando, pudesse com eles povoar a
ilha, que por esta causa daí em diante foi em crescimento.”
O erudito e mecenas judeu Isaac Abravanel (1437–1508), nascido em
Lisboa, chamava a ilha de São Tomé de Ha-Timsahim, a ilha dos Lagartos, em
alusão aos enormes répteis existentes no local e também para não pronunciar o
nome de um santo católico.
De acordo com o historiador Elias Lipiner (1916-1998), estudioso da
história luso-judaica e autor de livros sobre o tema (agraciado post mortem pelo governo de Portugal com a Comenda da Ordem do Mérito), Abravanel fala dessas
criaturas semelhantes a crocodilos que chegavam a medir 10 metros. “Os lagartos
saiam do mar para a ilha em busca de presa (...) e não obstante a luta dos
homens contra eles com espadas, lanças, martelos e machados (...) eram capazes
de devorar, por inteiro, um bezerro ou um menino.”
Sem rastros
No reinado de D.Manuel (1469-1521) que se seguiu ao de D.João II, a
situação dos judeus que permaneceram em Portugal também foi difícil e
dramática. O rei assina em dezembro de 1496 o Édito de Expulsão e dá um prazo
de 10 meses para a saída dos judeus do reino. Mas, durante esse período, além
de dificultar ao máxima a saída das famílias, quatro meses depois do édito
determinou que os filhos menores de 14 anos de pais judeus fossem arrancados de
seus pais, batizados e entregues a famílias católicas. O rastro dessas crianças
perdeu-se no tempo.
Estima-se que dos 120 mil judeus que vieram da Espanha e mais os 75 mil
judeus portugueses que viviam no país, somente 5 mil conseguiram escapar (
porque a maioria não podia pagar as taxas estipuladas pela Coroa), ficando o
restante condenado à conversão. São os chamados cristãos novos ou marranos
(convertido à força, do hebraico com castelhano, ‘mumrrano’, segundo Lipiner no
livro ‘Santa Inquisição: terror e linguagem’).
A Inquisição teve seus primórdios
em 1223, a partir da emissão de uma Bula Papal contra os hereges na França
emitida pelo papa Gregório IX. Através dos séculos aterrorizou e perseguiu
pessoas, e documentos falam em 300 mil condenações e 30 mil execuções.
Desde 2015, quando o Parlamento espanhol aprovou uma lei que concede
cidadania a qualquer pessoa que possa provar pelo menos um ancestral judeu que tenha
sido expulso durante a Inquisição, já foram aprovados 34 mil pedidos de
cidadania espanhola. Atualmente vivem na Espanha 13 mil judeus.
Em Portugal, onde a Inquisição funcionou por 285 anos
(1536-1821), já são 57 mil pedidos de cidadania portuguesa aprovados oriundos s
de mais de 60 países. Lá a lei de cidadania também foi instituída em 2015. Efetivamente cerca de 5 mil judeus residem em
Portugal.
Desterro inspira pesquisas
Em 2003, o diplomata e escritor Moshe Liba, nascido na
Romênia e que emigrou para Israel após o Holocausto, editou o livro “Jewish
Child Slaves in São Tomé” ( Crianças escravas judias em São Tomé), que reúne
artigos, ensaios e documentos sobre as consequências sociais e culturais desse
episódio escabroso da história. Seria uma possível miscigenação na formação da
sociedade na ilha e vestígios de hábitos e tradições dos judeus sefarditas
observados na população.
Primeiro embaixador de Israel em São Tomé, o livro – que teve
a coautoria do pesquisador e professor Norman Simms - é resultado de um seminário promovido na ilha
,em 1995, e que contou com a presença de estudiosos de vários países. Na
ocasião, recepcionado pelo então presidente da República de São Tomé e
Príncipe, Miguel Trovoada - que
posteriormente foi representante especial das
Nações Unidas para a Guiné-Bissau - LIba ouviu do político as seguintes
palavras: “Embaixador, temos raízes comuns. As crianças judias trazidas aqui
como escravos de Portugal foram os primeiros colonos desta ilha.”
Pelas pesquisas de Liba, apesar da falta de documentação do
destino das crianças, ele observa que registros históricos assinalam que alguns
conversos da ilha eram acusados de práticas judaicas. No livro “L’ancien Congo
d’après les archives romaines (1518-1640)”, os historiadores J. Cuvelier e
L.Jardin apresentam um documento de 1632 que em certo trecho afirma que ”a ilha
(São Tomé) está infestada de novos cristãos que praticam os ritos judaicos
quase abertamente”.
No texto assinado por Lipiner e incluído no livro (‘O
Primeiro Batismo Compulsório Coletivo Ocorrido em Portugal), o autor faz uma
diferenciação do status dos judeus na ilha, denominando-os de “cativos” e não
“escravos”, apesar de não serem pessoas livres (Lipiner, nascido na Bessarábia, viveu muitos anos no Brasil e depois emigrou para Israel).
Liba relata ainda que em suas andanças na iIlha somente
encontrou duas sepulturas judaicas (de Arão Gabai e Avraham Cohen) ao lado do
cemitério de São Tomé, datadas do final de 1800, provavelmente de comerciantes
que aportaram no local. Todavia, conversando com o bispo local, este disse que contam que as crianças foram enterradas nos arredores da igreja.
Por sua vez, Simms anota que no final do século 16,
documentos registram a presença de cristãos novos vindos de São Tomé para se
estabelecerem no Brasil nas plantações de açúcar. Pesquisador das raízes
judaicas na África no período dos descobrimentos e autor de “Jewish Children of
São Tomé”, ele especula que esses cristãos novos poderiam ser descendentes das
crianças judias que habitavam a ilha. “Existe a probabilidade que na época do
domínio holandês no Brasil, em meados do século 17 (1630 -1654), mais uma
geração de cristãos-novos, descendentes dos ”Filhos de São Tomé”, tenha vindo
se estabelecer na colônia, principalmente em Recife (Pernambuco).” Assim
deixariam para trás a Coroa Portuguesa e a Inquisição para retornar ao Judaísmo
ancestral.
Romances idealizam tragédia
Festejado pela crítica literária, o romance Órion do premiado
escritor português Mário Claudio foi lançado em Lisboa, em 2003, e tem como
tema central o rapto das crianças judias. A obra de ficção ambientada em São
Tomé acompanha a trajetória de mais de meio século de sete “moços” (meninos e
meninas) judeus trazidos à ilha, e que apesar do sofrimento e das adversidades
enfrentadas mantêm sua ligação com o D’us de seus antepassados.
Por duas vezes ganhador do Grande Prêmio de Romance e Novela,
da Associação Portuguesa de Escritores, Mário Cláudio usa uma linguagem lúdica
e alegórica para descrever aquela fatídica manhã, na Praça da Ribeira, onde as
crianças se reuniam. “Era uma manhã de
Abril, tão suave que mais parecia um agouro de acontecimentos festivos do que o
limiar de um holocausto que se preparasse.”
Em 2010, é a vez do americano Paul Cohn publicar “Sao Tome-
Journey to the Abyss-Portugal's Stolen Children” (São Tomé: Viagem ao Abismo -
Crianças Roubadas de Portugal), que ganhou o título “Rapto em Lisboa”, na
edição portuguesa. A história gira em torno de dois irmãos, um menino e uma
menina, sequestrados com outras crianças de uma sinagoga em Lisboa e embarcados
em uma caravela para São Tomé, a 4 mil milhas de Portugal.
Quatro anos depois, o escritor Orlando Trindade, natural de
São Tomé, publica o livro “Os meninos judeus desterrados” (2014), tendo como
fundo os primórdios da colonização da ilha e a chegada de centenas de crianças
judias que, em sua maioria, não resiste as agruras da viagem e o ambiente
inóspito. A narrativa segue um menino de seis anos que sobrevive à selva e às
dificuldades.
Já na década de 1980, a escritora de livros infanto-juvenis Henye
Meyer se inspira no triste episódio para escrever “The Exiles of Crocodile
Island” (Os exilados da Ilha dos Crocodilos). Americana de nascimento, ela vive
na Inglaterra e é autora de uma dezena de livros de temática judaica voltada
para o público adolescente. De acordo com o resumo apresentado pela editora, o
livro em questão narra a história de uma comunidade de crianças arrancadas de
suas casas pela Inquisição e sua luta desafiadora para manter sua fé em um
ambiente hostil.
Sem saída
Ainda na área de pesquisa histórica, a festejada obra do
escritor inglês de origem judaica Simon Schama (A História dos Judeus)
publicada em 2013, também aborda o episódio das crianças levadas de Lisboa a
São Tomé no reinado de D.João II. “Os judeus vindos de Espanha, sobretudo
crianças, seriam sujeitos a uma conversão rápida e iriam cristianizar São Tomé,
acasalados com os escravos africanos que também foram enviados para a ilha”,
assinala.
Professor nas Universidades de Harvard e Columbia e residindo
nos Estados Unidos, Schama igualmente cita outra ação envolvendo o rapto de
crianças judias, desta vez em 1497, ordenada pelo sucessor D.Manuel. E ressalta
que “nunca mais foram vistas”. Sobre Portugal da época, ele descreve: "Os
judeus ficaram presos no que foi, na realidade, o primeiro campo de
concentração, de onde não podiam fugir nem ter autorização para sair se não se
convertessem.”
Para o pesquisador americano Robert Garfield, Ph.D. em
Estudos Africanos e professor na Universidade DePaul, em Chicago, São Tomé,
quando foi descoberta em 1470 pelos portugueses que procuravam o caminho das
índias, era uma ilha incomum, longe da Europa, localizada no Golfo da Guiné e
desabitada. Foi colonizada por portugueses condenados, crianças judias
convertidas à força e escravos africanos. A mistura dessas culturas, segundo
Garfield, “criou uma sociedade inteiramente nova dentro da ilha”.
Autor do livro “A Chave para Guiné: Uma História da Ilha de
São Tomé 1470-1655”, publicado originalmente em 1992 e traduzido para o
português em 2019, Garfield fala sobre uma sociedade que floresceu na ilha,
formada por ricos plantadores de açúcar e dedicada ao comércio de escravos.
Enfrentando motins e rebeliões, a ilha foi atacada e invadida por europeus e
sua economia entra em colapso em pouco mais de quatro gerações.
O arquipélago de São Tomé e Príncipe também foi tema de um
Colóquio Internacional promovido pelo Instituto Universitário de Lisboa que atraiu
mais de 100 oradores, em 2012, para debater o colonialismo, o período pós-colonial,
a diáspora, literatura, linguística e desenvolvimento da região.
Uma publicação sobre o Colóquio apresentou mais de três
dezenas de artigos acadêmicos abordando os aspectos sociais, econômicos e culturais da
ilha ao longo do tempo. Sobre o início a colonização de São Tomé, documentos
citados indicam: “Vindos em 1493 com Álvaro de Caminha, chegaram também a São
Tomé 2.000 meninos judeus, cujos pais vieram para Portugal, expulsos de Espanha
pelos reis católicos. Era objetivo da
Coroa que fossem convertidos ao cristianismo e que ajudassem ao povoamento. Do
conjunto deles, de que nenhum excedia os oito anos, diria Pêro de Caminha,
terem dado boa conta da missão que lhes fora cometida. A sua integração na
restante da comunidade através do casamento, teria sido, contudo, problemática,
Do contingente inicial, em 1505/1506, reduziu-se apenas a 600.”
Lembrando
Valetim Fernandes como fonte, são apresentados os seguintes números em relação
à população da ilha, passados mais de uma década após a chegada das crianças:
“600 descendentes de judeus castelhanos; 200 moradores na povoação principal
(na maioria degredados); 1.000 moradores em toda a ilha (sem esclarecer se os
descendentes de judeus se encontram entre eles); 2.000 escravos a trabalhar; 5
a 6.000 escravos para resgate”.
A
Jewish Virtual Library comenta que até 1600, as práticas judaicas ainda podiam
ser observadas nas ilhas, mas que no século 18 a maior parte da herança judaica
já não existia. Também conta que uma pequena comunidade foi estabelecida nos
séculos 19 e 20 com a chegada de alguns comerciantes judeus de cacau e açúcar.
Mas, hoje, não há judeus vivendo nas ilhas.
Atualmente, a República de São Tomé e Príncipe (a distância entre as
ilhas é de 140 km) tem em torno de 215 mil habitantes, ficou independente em
1975 e a língua oficial é o português. A principal atividade econômica do
arquipélago é a agricultura, com base na exportação de semente de cacau, e a
pesca. Segundo o Banco Mundial, um terço da população vive abaixo da linha
internacional da pobreza (US$1,90 por dia).
Judeus no mundo
A título de informação, seguem os mais recentes números da
população judaica, divulgados no final de 2021, pelo “Israel Central Bureau of
Statistics” (CBS). O país soma 6,9 milhões judeus israelenses, em uma população
que engloba ainda 1,9 milhão de árabes israelenses e 472 mil de raízes
diversas, totalizando 9,2 milhões de habitantes. Segundo o jornal “Israel
Yahom”, a população judaica global chega a 15,9 milhões.
Em relação à Diáspora, os números apurados são:
França: 446.000; Canadá: 393.000; Grã-Bretanha: 292.000;
Argentina: 175.000; Rússia: 150.000; Alemanha: 118.000; Austrália: 118.000; Brasil: 91.500; África do Sul: 52.000;
Ucrânia: 43.000; Hungria: 47.000; México: 40.000; Holanda: 30.000; Bélgica:
29.000; Itália: 27.000; Suíça: 18.500; Chile: 16.000; Uruguai: 16.000; Suécia:
15.000; Turquia: 14.500; Espanha: 13.000; Áustria: 10.000; Panamá: 10.000.
Cerca de 27.000 judeus vivem em estados árabes e muçulmanos,
dos quais 14.500 vivem na Turquia, cerca de 9.500 no Irã, cerca de 2.000 no
Marrocos e aproximadamente 1.000 na Tunísia.
Os países com população judaica de 500 pessoas ou menos
incluem: Emirados Árabes Unidos, Bermudas, Bahamas, Bahrein, Barbados, Cuba,
República Dominicana, El Salvador, Jamaica, Curaçao, Ilhas Virgens, Bolívia,
Suriname, Chipre, Malta, Eslovênia, Bósnia , Albânia, Macedônia do Norte,
Armênia, Quirguistão, Tadjiquistão, Turcomenistão, Indonésia, Filipinas, Coreia
do Sul, Taiwan, Tailândia, Congo, Botswana, Quênia, Madagascar, Namíbia,
Nigéria, Zimbábue, Iêmen, Síria e Egito.
Observação: com estreia marcada para 29 de janeiro de 2023,em Lisboa, o drama musical O Rapto dos Inocentes é mais uma obra cultural que tem como tema o infortúnio dessas crianças e suas famílias vítimas de uma época de horror. Segundo o libreto "esta é a história de coragem e de sobrevivência da família de Jacob, que vê o seu filho mais novo ser raptado em Lisboa e levado para S.Tomé e Príncipe por ordem da coroa portuguesa".