“Educar é apostar no outro” (Feuerstein)
Há quase 15 anos, um senhor de longa barba
branca, sorriso bondoso e olhos meigos aterrissou em Salvador, na Bahia. O ano
era de 1999 e ele, apesar da roupa escura e pesada, parecia bem à vontade
naquele paraíso tropical. O professor e psicólogo Reuven Feuerstein, então
beirando os 80 anos, vinha do outro lado do mundo, do pequeno estado de Israel,
para assinar um contrato com o governador do estado e a Fundação Luis Eduardo
Magalhães na área da educação pública. Pelos próximos 10 anos, até 2009, o seu
método de melhoria de aprendizado conhecido como PEI – Programa de
Enriquecimento Instrumental, seria aplicado nas escolas de ensino médio baianas.
Na ocasião, Feuerstein declarou textualmente: “É a primeira vez quer um governo
entende que a inteligência é um direito, e assume o dever de proporcionar
condições para desenvolvê-la.”
O método, que visa aumentar o potencial de aprendizado dos
alunos, foi criado há quase 50 anos em Israel por Feuerstein para aumentar o
desempenho cognitivo de crianças e jovens sobreviventes dos campos de
concentração da Segunda Guerra Mundial. Atualmente vem sendo utilizado em mais
de 40 países, sempre sob a supervisão do ICELP de Jerusalém (Internacional
Center for the Enhancement of Learning Potencial), fundado pelo professor Feuerstein
– ele mesmo um sobrevivente do Holocausto.
O programa em larga escala desenvolvido na Bahia durante 10
anos é sempre citado por Feuerstein como um dos mais importantes para a
divulgação de sua teoria. Em 2004, na Holanda, por ocasião do 25º Seminário
Internacional do ICELP, a experiência baiana ganhou efusivos elogios do mestre
israelense: “O Brasil merece os parabéns não apenas como campeões do futebol,
mas também por ser um exemplo pelos cuidados com o desenvolvimento, progresso e
adaptabilidade a grandes massas de populações carentes de ajuda (...). Por isto
e por muito mais gostaríamos de expressar a nossa gratidão às autoridades
educacionais na Bahia e no Brasil, em geral.”
Um método que nasceu com os órfãos de guerra
Reuven Feuerstein, de 92 anos, iniciou os seus estudos de
Pedagogia e Psicologia na Romênia e emigrou para Israel em 1944, com 23 anos.
Ainda em Bucareste, entre 1940 e 1944, foi professor de crianças com distúrbios
e deficiências de aprendizado. Fez parte da Resistência contra os nazistas e
teve que fugir para se salvar. Em Israel, entre 1945 a 1948, atendeu os órfãos
sobreviventes dos campos de concentração, muitos deles classificados, nos
testes de QI, como mentalmente retardados.
Concluiu seus estudos em Psicologia geral e Clínica na
Universidade de Genebra (1954) e obteve o Doutorado em Psicologia do
Desenvolvimento na Universidade de Sorbonne, em Paris (1970). Estudou com
grandes mestres, como Carl Jaspers, Carl Jung, L. Szondy, Andrey Rey e Jean
Piaget. Entre 1950 e 1954 foi diretor do Serviço de Psicologia do Programa Youth Aliyah, na Europa, que trouxe
milhares de crianças e adolescentes judeus de Marrocos, Tunísia, Argélia e
Egito para uma vida integrada em Israel. Durante muitos anos foi diretor do
Instituto de Pesquisas Hadassah-Wizo-Canadá, em Jerusalém - para crianças com
distúrbios emocionais e mentais – incorporado, em 1993, ao ICELP.
Sua teoria parte do princípio de que o cérebro é
modificável, e por isso é possível elevar o nível de inteligência em crianças e
jovens marcados por grandes privações e traumas. De forma geral, o programa é
formado por 14 exercícios semelhantes a testes psicotécnicos. O aluno explica
como fez para resolver os exercícios, discute as conclusões e as relaciona com
sua vida. Desenvolve a capacidade analítica, o raciocínio lógico e a autoestima,
além de trabalhar a ansiedade e a impulsividade.
Feuerstein também ensinou Psicologia Educacional na
Universidade Bar-Ilan, em Ramat Gan e foi professor adjunto da Vanderbilt
University’s Peabody College of Education, nos Estados Unidos. Filho de rabino
e pai do rabino Rafi Feuerstein – também psicólogo e vice-diretor do ICELP - o
professor Reuven tem um neto de 24 anos com Síndrome de Down.