/ Sheila Sacks /
Há poucos dias, em 22 de janeiro, manchete do jornal Jerusalem Post anunciava que 2021 foi o ano mais antissemita da última década – “2021 was the most antisemitic year in the last decade”. Uma notícia dada às vésperas do Dia Internacional do Holocausto, celebrado anualmente em 27 de janeiro, e que reforça, ainda mais, o compromisso de todo o cidadão de bem de enfrentar e combater essa terrível chaga que ainda conspurca nossas sociedades.
Com base no relatório anual
publicado pela Organização Sionista Mundial (World Zionist Organization) e a
Agência Judaica(Jewish Agency), o jornal israelense destaca que os principais
incidentes foram pichações, vandalismo, profanações e principalmente
propaganda antissemita.
Em maio, de acordo com o
jornal, foi o mês onde ocorreram muitas situações de tensão, com eventos
de aglomerações e incitamento contra os judeus do tipo Nakba Day, Jerusalém Day e
Al-Quds Day. Também houve um acirramento na escalada de violência provocado pela disputa judicial envolvendo palestinos em Sheikh Jarrah, além dos inúmeros
tumultos judaico-árabes nas cidades mistas de Israel.
A Operação Guardiões dos Muros
(Operation Guardian of the Walls) que combateu terroristas do Hamas e a Jihad
palestina, em Gaza, igualmente causou reações antissemitas ao redor do mundo.
Iniciada em 10 de maio, destruiu 100 quilômetros de túneis subterrâneos lotados
de munição. De Gaza, os terroristas
lançaram mais de 4 mil foguetes contra cidades israelenses e civis, sendo que
90% deles foram interceptados pela sistema de defesa aérea do país.
Foi observado que a cada
manifestação de grupos contrários a Israel e eventos de confronto entre
israelenses e palestinos, houve um aumento expressivo de incidentes
antissemitas em vários locais do planeta.
Pandemia
e Holocausto
Em relação à pandemia de Covid 19,
que se estendeu por todo ano de 2021, um fenômeno preocupante foi observado no
relatório: manifestações em várias cidades da Europa comparando a vacinação
obrigatória às políticas da Alemanha nazista durante o Holocausto. Nesses
protestos muitas pessoas ostentaram estrelas amarelas para destacar a suposta
comparação.
De acordo com o relatório, o uso
desses símbolos cria um enfoque inquietante já sentido em várias ocasiões. A chamada “banalização do Holocausto”, ou a banalização do mal, cujo objetivo
principal é apequenar as dimensões trágicas e a singularidade daquele que foi o
maior e o mais horrendo massacre humano do século. Portador de uma importância
histórica sem precedentes na cultura moderna.
A Europa continua sendo o continente
onde ocorre grande parte dos eventos antissemitas, seguido pelos Estados
Unidos, com 30% dos incidentes. Houve aumento significativo de antissemitismo
no Canadá e na Austrália. Em Nova York duplicou os casos, totalizando 503
incidentes em 2021, assim como em Los Angeles, que viu subir em 59% a incidência
desse tipo de preconceito.
Alemanha, com 1.850 incidentes,
Reino Unido (1.308), França (583, um aumento de 75% em relação a 2020) e Áustria foram os países com mais casos de antissemitismo, inclusive envolvendo agressões físicas.
O poder maligno da inveja
Coincidentemente, no início de
janeiro, o site do rabino Sir Jonathan Sacks (1948-2020) republicou uma prédica
intitulada “A estrutura de uma boa sociedade” - The Structure of the Good
Society.
No texto, o rabino, nascido em Londres e agraciado com o título de Lord pela rainha Elizabeth II, analisa os
comandos dos “Dez Mandamentos” outorgados a Moisés no Monte Sinai. Ele explica
que a Torá os chama de asseret ha-devarim , isto é, “dez
enunciados”. Daí a tradução grega, Decálogo, que significa “dez palavras”.
Em sua explanação, os comandos estariam
estruturados em três grupos de três, com um décimo separado dos demais. No
terceiro grupo de três comandos – contra o adultério, o roubo e o falso
testemunho – são estabelecidas as instituições básicas que sustentam a sociedade.
Mas, o tópico que merece maior reflexão é sua abordagem sobre a proibição
autônoma que envolve a inveja: “Não cobiçarás a casa do teu próximo, não
cobiçarás a mulher do teu próximo, e seu servo, e sua serva, e seu boi, e seu
asno, e tudo que seja teu próximo.”
Para o rabino Sacks, o maior desafio
de qualquer sociedade é conter o fenômeno universal e inevitável da inveja, o
desejo de ter o que pertence a outra pessoa. E ele lembra: “ Foi a inveja que
levou Caim a assassinar Abel, fez Abraão e Isaac temerem por suas vidas porque
eram casados com belas mulheres, levou os irmãos de José a odiá-lo e vendê-lo
como escravo. É a inveja que leva ao adultério, ao roubo e ao falso
testemunho.”
E prossegue: “Cada um de nós tem sua
própria tarefa e suas próprias bênçãos, e cada um de nós é amado e estimado por
Deus. Viva por essas verdades e haverá ordem. Abandone-os e haverá caos. Nada é
mais inútil e destrutivo do que deixar a felicidade de outra pessoa diminuir a
sua, que é o que a inveja faz. O antídoto para a inveja é, como bem disse Ben
Zoma, - regozijar-se com o que temos (Mishná Avot 4:1 ) - e não se
preocupar com o que ainda não temos. As sociedades de consumo são construídas
sobre a criação e intensificação da inveja, razão pela qual levam as pessoas a
ter mais e desfrutar menos.”
Ao finalizar o texto, o rabino Sacks
oferece aos leitores uma orientação espiritual descomplicada e ao alcance de
todos. Diz ele: Trinta e três séculos depois de terem sido dados pela primeira
vez, os Dez Mandamentos continuam sendo o guia mais simples e curto para a
criação e manutenção de uma boa sociedade. Muitas alternativas foram tentadas,
e a maioria terminou em lágrimas. O sábio aforismo permanece verdadeiro: quando
tudo mais falhar, leia as instruções,
conclui.
Nada mais adequado para a celebração
deste 27 de janeiro de 2022, data que marca a libertação do campo da morte Auschwitz-Birkenau,
há exatos 77 anos. Que as Dez Instruções iluminem as sociedades, os governos e
todos aqueles que têm a responsabilidade pública de zelar pelos valores morais
e manter as instituições livres e justas no respeito e defesa da liberdade de
cada um.
Holocausto, Nunca Mais !